quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A Justiça Administrativa em Revista

“DO ESPÍRITO DAS LEIS,OU DA RELAÇÃO QUE AS LEIS DEVEM TER COM A CONSTITUIÇÃO DE CADA GOVERNO, COM OS COSTUMES, O CLIMA, A RELIGIÃO, O COMÉRCIO, ETC. A QUE O AUTOR
ACRESCENTOU PESQUISAS RECENTES SOBRE AS LEIS ROMANAS NO QUE TOCA ÀS SUCESSÕES, SOBRE AS LEIS FRANCESAS E SOBRE AS LEIS FEUDAIS.

Prolem sine matre creatam. OVÍDIO

Advertência do Autor
Para a inteligência dos quatro primeiros livros desta obra, deve-se observar que o que chamo de virtude na república é o amor à pátria, ou seja, o amor à igualdade. Não é uma virtude moral, nem uma virtude cristã, é a virtude política; e este é o motor que move o governo republicano, como a honra é o motor que move a monarquia. Logo, chamei de virtude política o amor à pátria e à igualdade. Tive ideias novas; logo, foi preciso encontrar palavras novas, ou dar às antigas novas acepções. Aqueles que não entenderam isto fizeram-me dizer coisas absurdas, que seriam revoltantes em todos os países do mundo porque em todos os países do mundo se quer a moral.

2° É preciso prestar atenção à diferença muito grande que existe entre dizer que uma certa qualidade, modificação da alma, ou virtude, não é o motor que faz agir um governo e dizer que ela não se encontra neste governo. Se eu dissesse: tal roda, tal pino não são o motor deste relógio, se concluiria que eles não estão no relógio? Da mesma forma, as virtudes morais e cristãs estão tanto menos excluídas da monarquia quanto a própria virtude política não o está. Em uma palavra, a honra está na república, ainda que a virtude política seja seu motor; a virtude política está na monarquia, ainda que a honra seja seu motor.
Enfim, o homem de bem do qual se trata no livro III, capítulo V não é o homem de bem cristão, e sim o homem de bem político, que possui a virtude política da qual falei. É o homem que ama as leis de seu país e age por amor às leis de seu país. Dei uma nova luz a todas estas coisas nesta edição, fixando ainda mais as ideias: e, na maior parte dos lugares onde usara a palavra virtude, coloquei virtude política.

MONTESQUIEU

Prole de geração espontânea, o contencioso administrativo floresceu no nosso seio sem preparação prévia nem doutrina assente.
O compasso e a bússola que nos deviam orientar nesta terra incógnita, a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, não são instrumentos de fiar, pela incerteza, variação, entendimentos diferentes, flutuações de raciocínio, ao sabor do momento e da sapiência de cada Juiz.
Um corpus jurisprudencial que se devia sólido, constante, feito de precedentes, seguindo um fio visível de raciocínio jurídico, constata-se ser apenas uma via sinuosa e sem sentido aparente.
Coisas tão simples como a tutela jurisdicional efectiva ou a igualdade de armas, soçobram perante a jurisprudência (se isso se lhe pode chamar) das primeiras instâncias, a morosidade silenciosa e triste dos Tribunais Centrais e a insensibilidade do STA.
Nuns casos por visível falta de formação humana, ou jurídica ou para a função, noutros por pura preguiça, desentendimento ou alheamento, os tribunais administrativos não correspondem, nem de perto, às altas expectativas postas neles pela reforma de 2004.
Não é por falta de meios humanos ou logísticos, nalguns casos, como o da presença do Ministério Público, até em excesso ao ponto da nocividade, que o sistema concebido para funcionar não funciona.
Qualquer praticante da arte se apercebe destas insuficiências no dia-a-dia. Muitos de nós temos soluções para muitos dos problemas que nos afligem, sugestões de melhoria ou alteração radical, mas não temos onde as exprimir.
Há também raios de sol, excelentes sentenças fundamentadas em processos limpos, de trajecto seguro, que são exemplos do que deve ser.
Proponho um foro de intercâmbio, mais de experiências que de ideias, que não se pretende o motor intelectual de nenhuma alteração, mas também não o exclui, em que os práticos e os teóricos do contencioso administrativo, sem pretensões de teorizar possam sugerir e comentar.
Caberão neste blog comentários de jurisprudência, peças teóricas, meras sugestões, apontamentos de vida dos tribunais administrativos, na medida em que cada um possa contribuir, no tempo em que cada um o possa fazer, sem obrigações nem prazos.
À medida que avançarmos definiremos a nossa própria «jurisprudência», ou seja o nosso modo de operar.

Inspiro-me nesta iniciativa em Mouzinho da Silveira, o homem das grandes reformas administrativas.